quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Uma certa idéia de lar


Thiago Thiago e Renato Frazão nos violões, Lucas Dain e Mila Chaseliov cantando; no fundo Laura lê

Alguns blogs são bastante profissionais e informativos, enquanto outros têm a capacidade de nos abrir a porta das almas de seus escribas. É como se nos convidassem a um cafezinho, a uma certa intimidade, que nos permite especular sobre suas vidas, suas coisas. Vendo um deles outro dia viajei nas fotos de pequenos detalhes da casa, como livros e coisas espalhadas pela sala, o banheiro, e também nos textos que contextualizam de forma onírica e bastante original as coisas que rondam essa alma.


Na parede, trabalhos de Manduka

De minha parte, me mudei recentemente e como tudo o que tenho de bens materiais são livros e CDs, vocês podem imaginar a bagunça que a casa anda. Os livros amontoados, maltrados, sem estante para todos. Mas, mesmo nessa zona, sinto-me entre eles num aconchego que se traduz em pequenos gestos, num vinho aberto, na alquimia da cozinha, inventando coisas (ganhei açafrão de uma amiga que chegou da Turquia...). O legal é criar, como colocar uma estante de livros no banheiro ou uma rede sobre o futom que fica no chão para o caso de hóspedes.


Lucas acende o cigarro em meio a copos e copos... caos na mesa

Depois de um período difícil por uma série de razões, começo agora a abrir lentamente a caverna para os de fora. Outro dia, rolou um som com o pessoal do Escambo e amigos, como Mila Chaseliov, Leo Feijó, Enrica Bernardelli, João Saboia, entre outros. Aproveito então para colocar as fotos desse encontro, quando fizemos coletivamente um risoto e derrubamos uma boa dúzia de tintos encorpados.


Thiago, Enrica, livros e tijolos...

sábado, 26 de setembro de 2009

Sexo & violência


Charlotte Gainsbourg em cena do Anticristo (foto de divulgação)

Todo mundo que gosta de cinema já deve estar meio cansado da controvérsia em torno do filme do cinesta dinamarquês Lars Von Trier, o Anticristo. É um filme que não recomendo a ninguém, mas que considero uma obra de arte. Daquelas que você sai um pouco diferente depois de passar pela experiência de ter entrado em contato com ela. Muito distinto dos filmes de entretenimento que abundam as salas de cinema. Mas é, por isso mesmo, um filme duro. Com cenas explícitas de sexo e violência, o terror fica na borda do sobrenatural e da loucura humana. O prólogo é uma aula de cinema.


Portrait de Charlotte (foto tirada da internet): parece com a mãe e o pai

Mas não é sobre o filme que quero falar aqui e sim sobre a atriz principal. Charlotte Gainsbourg é uma excelente atriz e nesse filme mostra uma entrega total ao papel. Me lembrou a reclamação do Glauber Rocha acerca dos limites morais dos atores, que ele sempre procurava ultrapassar. Ele certamente ficaria feliz em poder trabalhar com ela. A entrega total é um dos preços que uma obra de arte cobra do artista. No caso do cinema, de toda a equipe.


Jane Birkin em 1968, à época do je t'aime moi non plus

Vendo-a no filme de Von Trier me lembrei de sua mãe, a atriz Jane Birkin, que também fez um filme ousado: Je t'aime moi non plus, de Serge Gainsbourg, seu marido e pai de Charlotte. O filme é de 1976, além de Jane, o então jovem Gerard Depardieu também está no elenco. A canção-tema e homônima, no entanto, é de 1968 e foi gravada pela então namorada de Serge, Brigitte Bardot. Logo depois da gravação, o casal se separou e Brigitte suplicou a Serge que não a lançasse, pois trazia o áudio explícito de um casal trepando, e ela havia casado com um empresário alemão. Serge concordou. Logo depois, ele conheceu Jane Birkin, uma jovem atriz britânica, que se tornou sua mulher e ele regravou a canção, dessa vez com ela. A música estorou no mundo no início de 1969.


Mais uma foto de Jane Birkin, tirada da internet

Naquela época, eu estava na pré-adolescência, e o Brasil vivia sob uma assombrosa ditadura militar, que também tinha seu viés de repressão moral. Quando a canção chegou às rádios, foi um deus-nos-acuda e ela acabou censurada. Mas eu consegui comprar um compacto, antes que fossem recolhidos. Aquela sonoridade erótica ficou em minha mente. Um casal trepando, os gemidos, com fundo musical, gravados de forma explícita. Desde então, sempre associei a língua francesa a sexo e erotismo. O filme eu só vi muitos anos mais tarde, em outro momento, mas dá para entender o impacto na sociedade burguesa daquela época.

Logo depois, em 1972, Bertolucci viria com o Último tango em Paris. Sexo & violência sempre andando juntos nesses filmes, como em Laranja Mecânica, do Kubrick, de 1971. Posso estar completamente enganado, mas penso que as coisas foram mudando no rumo de uma dureza (êpa!). Se naquele então, a putaria era o que dava o tom nessas obras, e a violência vinha a reboque, a impressão que tenho é que, hoje, a violência predomina. Penso, por exemplo, no filme de Gaspar Noé, Irreversível, de 2002. A cena do estupro desse filme é muito mais barra pesada do que a de Laranja Mecânica, ou a famosa cena da mantega, no Último tango, hoje uma sequencia quase lírica.

Não sei se era a repressão da época, que fazia a gente tremer a qualquer insinuação sexual, e portanto uma canção como Je t'aime moi non plus nos deixava à flor da pele, ou se é, hoje, o niilismo dessa pós-modernidade, que está exigindo uma violência que se dá simultaneamente na força física e emocional.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Armazém Senado


O Armazém Senado visto da esquina

Outro dia à tarde, tentando esfriar a cabeça, dei uma caminhada pelo Centro velho do Rio e acabei parando no Armazém Senado, centenária casa na esquina das ruas do Senado e Gomes Freire. Esbarrei com Moacyr Luz e uma mesa animadíssima, diante de uma boa garrafa de tinto (dificilmente se beberá vinho no Rio na melhor relação custo-benefício). Foram algumas horas de boa conversa jogada fora. Conheci o Gabriel, que canta na roda de samba da rua do Ouvidor com o Pratinha, e o músico Paulinho Lemos, que vive em Barcelona, parceiro das antigas de Moa. Também à mesa, fregueses assíduos do Armazém. Na saída, fiz umas fotos do Armazém com a câmara do celular, que não é lá essas coisas, mas ei-las.


As bandeiras da casa


A esquina do Armazém

domingo, 13 de setembro de 2009

No aeroporto



Querida amiga, na última vez que a vi, você atravessava o portal que leva ao avião. Observei seu caminhar resoluto, cosmopolita, as bolsas nas mãos. Apenas um breve olhar para trás e o esboço de um sorriso. A cada passo me deixava mais só no grande aeroporto, imenso em minha solidão, vasto na despedida que vinha da véspera em sua casa. Depois de uma vida toda feita de partidas e chegadas, o aeroporto ainda me é lugar estranho, de acontecimentos e ocorrências capazes de perturbar a alma. Sua partida, uma delas. Do saguão, faço minha saudação tropical e me despeço. Coração na mão que acena à sala de embarque, cega do meu adeus. Enquanto o avião desaparece nas nuvens, volto à cidade que, vazia de sua presença, já não é mais a mesma. Olho para cima em busca de luzes no céu e o infinito me engole.