quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Agrupamentos e movimentos


Estava lendo o catálogo da exposição sobre a poesia marginal que o IMS organizou. Me lembrei da exposição que vi em Paris sobre Richard Prince, da turma underground americana dos anos 1960. Também estou lendo os cadernos do Helio Oiticica, onde ele maquinava seus projetos de instalações e arte conceitual. Muito interessante ver o registro da mente de uma pessoa genial como HO.

Mas voltando ao catálogo dos marginais, a introdução, escrita por Frederico Coelho, faz uma boa análise, mas senti uma certa forçação para dar a esse grupo heterogêneo de poetas um sentido de grupo. Uma das suas estratégias é separá-los de outros grupos de poetas da nossa contemporaneidade. Mas como isso é insuficiente, ele não tem como escapar a certas contingências históricas que explicam por que escritores distantes em seus estilos foram reunidos sob o signo de marginal.

Isso me deu asas pra pensar muitas coisas, que só vou alinhavar aqui, enquanto elas vão ganhando uma forma mais consistente em meu raciocínio. Em primeiro lugar, fica claro que há agrupamentos e movimentos. Uma coisa são os modernistas e as vanguardas pós-1950, com seus manifestos e cânones. Por mais vanguardistas que sejam, esses movimentos têm vinculações com linhagens com tradições. Como dizia o Risério, a vanguarda tem uma relação dialética com a tradição, nem que seja o rompimento. E esses grupos se forjaram por meio desse relacionamento problemático, o rompimento do filho com o pai, como uma espécie de processo psicanalítico coletivo. Daí suas regras estritas expressas em manifestos e prescrições. Combatem formalismo com formalismo.

Outra coisa bem diversa são agrupamentos. Os poetas marginais e os da geração de 45 estão a meu ver nesse segundo grupo. Não dá para classificar a poesia marginal ou a produção dos poetas de 45 como um movimento, pois o que os amarra no discurso descritivo são coisas contingenciais, como a forma material de produzir (o mimeógrafo, no caso dos marginais), ou como preocupações estéticas gerais, como o retorno a certo formalismo para romper com ele novamente, como no caso da geração de 45. Como colocar no mesmo grupo, por exemplo, Geraldo Carneiro e Chacal; Cacaso e Wally Salomão?

Há muito fetichismo e considerável desconhecimento sobre esses agrupamentos. O próprio Coelho, na introdução do catálogo da exposição dos marginais, se refere ao soneto como uma obrigatoriedade da produção poética da geração de 45. Taí um agrupamento pouco debatido, compreendido e mergulhado num relativo esquecimento da crítica, da mídia e dos poetas contemporâneos. A volta ao formalismo rompido pelos modernistas nunca foi perdoado. Foi mal compreendido como um retrocesso em relação à vanguarda dos anos 1920. Mas, na verdade, a experiência do retorno à forma era a forma de poder romper novamente com a tradição. Antes de recorrer ao verso livre, aprender a redondilha e as formalidades das linhagens tradicionais, reforçando a experiência do rompimento.

Mas isso não está escrito em lugar nenhum. Aparece em conversas dispersas, em pedaços de declarações e depoimentos incompletos. Nas entrelinhas. É preciso pescar essa percepção das empoeiradas estantes das bibliotecas, mas isso dá trabalho e uma geração como a de 45 não desperta interesse midiático. É melhor falar de poetas ligados a certos movimentos, como as vanguardas pós-50, abençoadas pelo tropicalismo de Caetano & Gil. Taí uma explicação possível para o sucesso editorial da poesia de Leminski: sua vinculação por afinidade a uma estética e filosofia que se tornou vitoriosa na contemporaneidade. O tropicalismo é o hoje o nosso cânone.  


Enquanto isso, lembro que o Coletivo Chama convida para o show de lançamento do segundo CD do Escambo, Neon, hoje, no Espaço Cultural Sérgio Porto, às 20h.

domingo, 8 de setembro de 2013

Enquanto isso




Não me lembro se foram nove setembros ou sete novembros. O tempo não escorria assim naquele hiato. Era um estar estando, e quando o raciocínio vinha, o momento já era outro. É como se ideia como tal só fosse possível no passado. O pensamento como algo ido. Lá atrás. Ou então se projetava para frente. Num a-vir, num a-qualquer-momento. Como será tudo lá adiante. Amanhã. Depois da esquina de nossos dias. Enquanto isso, no agora, só vida e sonho. Intensa vida ao seu lado, amiga. Circulando, embrenhando, penetrando. Sofrendo, gozando. Simbiose. Um limbo tão extasiante quanto irreal. Tão irreal como tempo esquecido em tantos outubros, em muitos dezembros.