Caiu em minhas mãos um CD excelente. Minimalista bem de acordo com os tempos atuais, reúne a cantora paulista Juliana Amaral a poucos e bons músicos. Batizado de SM, XLS (samba mínimo, extra luxo super), o disco tem como proposta a música no esplendor do básico. A voz, excelente, de Juliana, acompanhada por um instrumento básico (a maioria das vezes um violão de sete cordas, bem executado por Gian Corrêa) e uma percussão sutil para realçar alguma ideia musical da poesia das letras, ou como acompanhamento rítmico (também muito bem executado por Samba Sam). Ouvindo o pandeiro, me lembrei do que me disse certa vez minha amiga Joana Saraiva: o pandeiro pode muito bem substituir uma bateria em algumas circunstâncias. E isso se comprova no disco de Juliana.
Quando Manduka estava gravando seu primeiro disco no Brasil,
em 1979, tive o privilégio de acompanhar todo o processo. Vi algumas das
canções nascendo, depois o Joca, guitarrista fenomenal, arranjando as bases e, em cima de
seus arranjos, Celinha Vaz, colocando orquestrações. Tudo excelente, tudo
sensacional. Mas intimamente preferia, por meu gosto, ouvir apenas o violão
majestosamente tocado por Manduka e sua voz singular. Mas os tempos eram ainda
aqueles em que a simplicidade era considerada um defeito. Naquele início dos
anos 1980, fazia-se música para ouvidos profissionais, achando que os pobres
mortais se encantariam mesmo sem entender as operações matemáticas das
sofisticadas harmonias, com suas inversões e malabarismos timbrísticos. E sobre
a base colocavam-se camadas de arranjos, de certa forma, apagando a essência da
canção. E eu, que conhecia as músicas de Manduka tocadas pelo próprio em seu
excelente violão, me sentia um tanto frustrado de perder essa essência.
O que Juliana faz neste CD é valorizar extremamente, como nenhuma orquestra poderia fazê-lo, a interpretação da cantora e o acompanhamento como suporte à voz, mas com suas próprias sutilezas e maestria. O estúdio gravou inclusive uns soluços, que transbordaram pela garganta da cantora, reforçando essa sensação visceral. E, voilà, o que era minimalista se torna grandioso.
Destacaria ainda a regravação de Acabou Chorare, do grande Moraes Moreira. Juliana coloca sua alma ali e, ao mesmo tempo, evoca o tom igualmente intimista da gravação original dos Novos Baianos. O disco traz ainda um recado paulista e, nesse sentido, é regionalista e um tanto mesmo provinciano, mas num bom sentido, com a competência e a qualidade que os paulistas normalmente empregam em suas produções. Incorpora composições de músicos de São Paulo ou que ali se abrigraram, como Itamar Assumpção e Tom Zé, além de vários compositores paulistas contemporâneos. Ela inclusive grava O mistério do samba, de Fred Zero Quatro e Marcelo Pianinho, que afirmam que o samba não é carioca nem baiano, mas sim pura invenção. Bem, isso é outro assunto e dá pano pra manga.
Mas fica a sugestão do belíssimo CD de Juliana, mais um disco bom para abrir o fim de semana. Voz e violão ou voz e clarinete ou voz e cavaquinho ou voz ou vibrafone... com uma percussão sutil e presente.
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