sábado, 26 de setembro de 2009

Sexo & violência


Charlotte Gainsbourg em cena do Anticristo (foto de divulgação)

Todo mundo que gosta de cinema já deve estar meio cansado da controvérsia em torno do filme do cinesta dinamarquês Lars Von Trier, o Anticristo. É um filme que não recomendo a ninguém, mas que considero uma obra de arte. Daquelas que você sai um pouco diferente depois de passar pela experiência de ter entrado em contato com ela. Muito distinto dos filmes de entretenimento que abundam as salas de cinema. Mas é, por isso mesmo, um filme duro. Com cenas explícitas de sexo e violência, o terror fica na borda do sobrenatural e da loucura humana. O prólogo é uma aula de cinema.


Portrait de Charlotte (foto tirada da internet): parece com a mãe e o pai

Mas não é sobre o filme que quero falar aqui e sim sobre a atriz principal. Charlotte Gainsbourg é uma excelente atriz e nesse filme mostra uma entrega total ao papel. Me lembrou a reclamação do Glauber Rocha acerca dos limites morais dos atores, que ele sempre procurava ultrapassar. Ele certamente ficaria feliz em poder trabalhar com ela. A entrega total é um dos preços que uma obra de arte cobra do artista. No caso do cinema, de toda a equipe.


Jane Birkin em 1968, à época do je t'aime moi non plus

Vendo-a no filme de Von Trier me lembrei de sua mãe, a atriz Jane Birkin, que também fez um filme ousado: Je t'aime moi non plus, de Serge Gainsbourg, seu marido e pai de Charlotte. O filme é de 1976, além de Jane, o então jovem Gerard Depardieu também está no elenco. A canção-tema e homônima, no entanto, é de 1968 e foi gravada pela então namorada de Serge, Brigitte Bardot. Logo depois da gravação, o casal se separou e Brigitte suplicou a Serge que não a lançasse, pois trazia o áudio explícito de um casal trepando, e ela havia casado com um empresário alemão. Serge concordou. Logo depois, ele conheceu Jane Birkin, uma jovem atriz britânica, que se tornou sua mulher e ele regravou a canção, dessa vez com ela. A música estorou no mundo no início de 1969.


Mais uma foto de Jane Birkin, tirada da internet

Naquela época, eu estava na pré-adolescência, e o Brasil vivia sob uma assombrosa ditadura militar, que também tinha seu viés de repressão moral. Quando a canção chegou às rádios, foi um deus-nos-acuda e ela acabou censurada. Mas eu consegui comprar um compacto, antes que fossem recolhidos. Aquela sonoridade erótica ficou em minha mente. Um casal trepando, os gemidos, com fundo musical, gravados de forma explícita. Desde então, sempre associei a língua francesa a sexo e erotismo. O filme eu só vi muitos anos mais tarde, em outro momento, mas dá para entender o impacto na sociedade burguesa daquela época.

Logo depois, em 1972, Bertolucci viria com o Último tango em Paris. Sexo & violência sempre andando juntos nesses filmes, como em Laranja Mecânica, do Kubrick, de 1971. Posso estar completamente enganado, mas penso que as coisas foram mudando no rumo de uma dureza (êpa!). Se naquele então, a putaria era o que dava o tom nessas obras, e a violência vinha a reboque, a impressão que tenho é que, hoje, a violência predomina. Penso, por exemplo, no filme de Gaspar Noé, Irreversível, de 2002. A cena do estupro desse filme é muito mais barra pesada do que a de Laranja Mecânica, ou a famosa cena da mantega, no Último tango, hoje uma sequencia quase lírica.

Não sei se era a repressão da época, que fazia a gente tremer a qualquer insinuação sexual, e portanto uma canção como Je t'aime moi non plus nos deixava à flor da pele, ou se é, hoje, o niilismo dessa pós-modernidade, que está exigindo uma violência que se dá simultaneamente na força física e emocional.

4 comentários:

Débora Aligieri disse...

Je t'aime moi non plusfez tanto sucesso que até hoje se ouve em alguns lugares, e a música serviu de base para muitas outras. O Vive la Fête, grupo francês eletrônico/rock usa como base em uma de suas músicas. E não é que os caras além de bens produtores são bons reprodutores. Linda a moça, Paulo.
Aproveito esse clima da sua postagem para deixar os links dos fonogramas da Rosalina Marcondes (Antropofágica e Sexy Boy, que pode ser baixado), e da Silvia Vasconcellos, minha parceria de poemas e fonogramas. Depois me diga o que achou e, se gostar espalhe por ai...Beijos

http://jornalapocalipse.blogspot.com/2009/09/antropofagica.html

http://jornalapocalipse.blogspot.com/2009/02/sexy-boy.html

ipaco disse...

Legal Débora, vou ouvir sim! Beijo.

andrea canto disse...

O Lars von Trier é um provocador maravilhoso! Não vi esse filme ainda, mas Dançando no Escuro é super dificil tb mas mto bom, visceral, me lembro que quando terminou a sessão num Odeon lotado o silencio era geral, acho que ninguém conseguia nem respirar!

ipaco disse...

Achei esse bem mais opressor, Andrea. Mas uma obra de arte.