O verão sempre teve em mim um efeito mágico. É como se as
coisas pudessem, enfim, dar certo. A primeira
vez que vivi essa sensação foi na infância, no Leblon, quando o bairro ainda
era relativamente pobre e as pessoas se misturavam mais. Nós tínhamos uma turma
de amigos da rua, na faixa dos 5 aos 9 anos, que, com uma ou duas mães, íamos à
praia juntos, no que, para mim, parecia ser uma grande expedição por longos quarteirões e ruas. O prazer de pisar na areia, de entrar n'água sob o sol, é
algo que ainda hoje perdura em mim. Uma sensação de euforia diante de coisas
simples.
Aos 12 anos, no Píer de Ipanema, a euforia ganhou contornos
sensuais. Estávamos em 1972, nas dunas do barato — com Gal gata, e Leila Diniz, mito —, e as meninas
gritando sua liberdade sexual, por meio de um fiapo de biquíni, chamado “tanga”. Os corpos lânguidos estendidos sobre a areia, tostando ao sol. Nos
tornáramos tribais e indígenas. O amor era intenso e misterioso. Também era despreocupado. Não havia ainda a sombra da morte, que a era da Aids trouxe. Tanatos invadindo a festa de Eros. As meninas
gemiam, num soluço angustiado, tinham pelos, e suspiravam apaixonadas. O sexo era banal, mas extremamente profundo. Havia um grito de liberdade comportamental tão radioso quanto o sol. As maneiras de viver estavam mudando rapidamente, mas vivíamos em
plena ditadura, o que atrapalhava muito.
Aos 20 anos, em minha primeira viagem à Amazônia, entendi a
importância da intensidade do calor em minha vida. Depois de ter vivido, anos
antes, nos Estados Unidos, e ter pego temperaturas geladas, compreendi que sou
um ser do trópico. A depressão e tristeza que sinto no frio, se transformam em
euforia sob o sol. E as matas suadas da Amazônia eram o calor na sua imensidão
úmida. Entendi porque aquele povo ribeirinho vive numa intensidade preguiçosa e
sensual. E me descobri da mesma tribo.
Mesmo agora, que o calor no Rio ganha alguns graus a mais,
represado por edifícios que bloqueiam o fluxo do vento, ainda percebo vestígios
da antiga euforia. Ela me faz ignorar as dores dos anos acumulados, da
respiração abafada, das perdas amorosas e me estimula a caminhar pela cidade.
Passo após passo, sigo rumo à orla mais próxima para morrer de saudade à beira
do mar. É quando penso nas viagens que ainda quero fazer. E tudo, ainda, parece
poder dar certo.
4 comentários:
belo texto, paulinho. o verão sempre me faz meio adolescente, reacende esperanças perdidas...
Andrea, muita saudade. Vou te ver no TriBoz! Beijo!
tem tudo a ver o que o poeta disse a respeito dele, o verão:
http://portalliteral.terra.com.br/ferreira_gullar/porelemesmo/verao.shtml?porelemesmo
Gullar é mestre!
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