quarta-feira, 29 de abril de 2009

Uma viagem ao oriente


Aninha e Bianca, numa birosca de beira de estrada, a caminho de Paraty

Pegamos a estrada no carro de Bianca. Eu, ela e Ana D. queríamos aproveitar a rara oportunidade de poder desfrutar quatro dias seguidos de folga, coisa rara para quem trabalha em redação de jornal, sobretudo no velho Jornal do Brasil. Nosso destino: Ilha Grande, onde tenho pouso certo na pousada de um casal amigo, gente simples, da terra, e de grande coração. Fica num recanto entre Abraão e Lopes Mendes, uma enseada ainda relativamente preservada da ocupação que tomou conta da ilha nos últimos anos. Nossa idéia era se largar ao sol, beber cerveja, nadar, comer e o que mais pintasse...

Já na estrada, embalados pelos CDs de música africana que levei, entramos naquele clima de euforia que toma conta de gente quando colocamos o pé na estrada, apesar do horário muy temprano. E seguimos discutindo os assuntos mais estratosféricos, aquelas conversas que começam no trabalho e terminam em sexo e relacionamento. E estávamos tão embalados nos enredos que, quando demos por nós, havíamos passado a entrada para Angra e, mesmo que fizéssemos o próximo retorno, perderíamos a última barca do dia para a Ilha Grande.

Primeiro veio aquela irritação generalizada, mas logo estávamos rindo de nossa distração e, calculando que estávamos a essa altura perto de Paraty, decidimos dormir na pequena cidade colonial e seguir para a Ilha Grande no dia seguinte. Chegamos à calçada de pedras centenárias quando a tarde começava a cair. Descolamos uma pousada na periferia (na verdade, dois quartinhos na casa de uma mulher local) e fomos almoçar-jantar. Descolamos um bar-restaurante na parte histórica e abrimos os trabalhos com umas branquinhas da região e logo nossa conversa pegava fogo. Beliscamos uns pastéis de camarão e coisa e tal e, com o cair da noite, veio o sono e o cansaço da viagem.


Bianca ainda animada, apesar das horas na estrada

Rumamos então para os quartos para uma sesta atrasada. Foi coisa de umas duas ou três horas e despertamos com disposição para passear na parte velha da cidade e descolar um lugar legal para jantar. Achamos, escondido num dos extremos de Paraty, de frente para um canal, uma pequena porta, com ar oriental, de onde vinha uma mistura forte de cheiros: incenso e temperos misteriosos. Entramos.

Era uma casa comprida. Na primeira parte, um balcão, onde ficava o caixa, e ao lado um palquinho, onde um sujeito tocava uns mantras indianos. O restaurante, porém, era tailandês. Incensos de cedro dominavam a casa e o calor suave contrastava com o frio da noite. Nos sentimos imediatamente aconchegados. Uma deusa, vestida com uma espécie de quimono de seda, veio nos receber e nos guiou até uma mesa nos fundos.

Depois de examinarmos o cardápio, minhas amigas pediram uma sopa de gengibre e eu vi uma entrada que me lembrou os nhoc nums vietnamitas (não sei se é assim que se escreve), que minha ex fazia com exímia dedicação. Uma espécie de pastel recheado com peixe triturado com umas ervas e leite de coco (pois é, no Vietnã se usa leite de coco e dendê). Mas nesse caso, em vez de massa, usava-se uma folha de alface, que servia de casca. Depois de enrolar aquele conteúdo exótico na folha, mergulhava-se num pote com uma espécie de molho, que lembrava shoyu, mas não era. É esse os tais nhoc nums, resultado de várias misturas. Coisa da sabedoria oriental.

Enquanto me entretinha na delicada tarefa de enrolar os bolinhos de peixe e mergulhar no pote de molhe, mal reparei que minhas amigas estavam com uma expressão esquisita. O seu silêncio acabou, por fim, chamando minha atenção. Elas suavam, pálidas. Haviam desistido de suas sopas de gengibre. “Arde muito”, conseguiu balbuciar Aninha.


Aninha e Bianca, enfim na Ilha Grande, numa parada antes de pegarmos uma trilha

Compadecido e um tanto contrariado, troquei minha deliciosa entrada pela sopa das meninas. Era um prato leitoso, aparentemente inofensivo. Investi com fé, enquanto Ana e Bianca se deleitavam nas massinhas de peixe. A sopa era deliciosa, mas lá pela terceira colherada, a coisa bateu e entendi imediatamente a diferença entre as pimentas que queimam, como a malagueta baiana ou a murupi amazônica, para as pimentas que ardem, como as das iguarias indianas e... tailandesas.

Não é aquela porrada de pronto. Vai aos poucos dominando com sua ardência até se tornar insuportável. Me lembrei então de um amigo indiano, que me disse que, nessas circunstâncias, deve-se ignorar a dor e seguir comendo. Foi o que fiz, mais para mostrar minha coragem cosmopolita a minhas amigas, do que para seguir o velho conselho. E aí deu-se a magia. A ardência era tanta que foi, aos poucos, anestesiando os lábios, a língua, o céu da boca, o cerebelo... o inconsciente. E, nesse ponto, com a sensibilidade no seu extremo, literalmente à flor da pele, comecei a perceber cada ingrediente, cada nuance, cada tempero daquela sopa e do jantar que seguiu.

De volta à pousada, os três conversamos sobre essa experiência e eu adormeci levado por sonhos de paixões furiosas e amores impossíveis, enfim, realizados.

sábado, 25 de abril de 2009

Tragédia em Maria da Graça


A chopeira do Amendoeira, cuja serpentina teria 96 metros

A essa altura, todo mundo já leu a má notícia. César Resende, dono do inigualável Bar da Amendoeira, foi assassinado ontem, aos 60 anos, após uma briga com um cliente e desafeto antigo. Não conhecia o César muito bem. Nas poucas palavras que trocamos vi simpatia, de modo que não consigo imaginar uma cena de briga tão violenta, que se deteriore para porretadas e tiros. Não combina. Prefiro manter à memória o velho botequim, batizado oficialmente de Café e Bar Lisbela e que, ao longo dos anos em que, imperioso, residiu à esquina da Conde de Azambuja com a Miguel Gama, em Maria da Graça, na zona Norte do Rio, se tornou uma referência para a boemia carioca.


César em pé, entre Julico (à esquerda), do Rio Botequim, e o querido Baiano

Fundado em 1935, como um aramzém, também já se chamou Café Rio D’Ouro, Armazém Dois-Dois, Cenaca Gelada, Bar do Manoel e Bar do Mário. Mas foi sempre a frondosa amendoeira, árvore da família das rosáceas, que chegou ao Brasil vinda da África, que deu nome ao estabelecimento.


Um garotinho na pressão, sobre o balcão do Amendoeira

O endereço também é o de um dos melhores chopes da cidade. Fazendo pesquisa pelo Rio Botequim, onde o Amendoeira é um dos poucos bares a ter saído em todas as edições, o César exagerava sobre o tamanho da serpentina. Um ano disse que ela tinha 96 metros e, em outro, 120. Não importa. A qualidade do chope é atestada pela nata da boemia carioca. O Amendoeira forma com o Adonis minhas referências de chope de excelente qualidade da zona Norte, onde predominam os bares com cerveja. Para o estômago, a estrela da casa é a carne seca (segundo o César, o consumo é em média de 30 quilos por dia), preferencialmente na sua versão tira-gosto, com farofa. Mas também se come uma excelente costelinha com quiabo e uma boa feijoada. Aos sábados, tem angu à baiana.


Mais uma do bar, o chope sempre impecavelmente vestido com colarinho

Um dado curioso é o sistema inventado pela casa para controlar as doses da malagueta: um canudo de plástico é colocado na compota da pimenta e bastar apertar uma das pontas que o canudo vira um conta-gotas. Pura física de botequim.


O Bar da Amendoeira, visto de dentro

Lembro de uma ida ao Amendoeira com a turma do Rio Botequim mais Wilson Flora, o Baiano, e Moacyr Luz. Estávamos vindo do Bar do Paulinho, em Higienópolis, e paramos ali para a saideira. Ficamos numa mesinha na calçada, perto da amendoeira. O Moa pegou um violão velho e a tarde virou noite suavemente. Foi um lindo anoitecer carioca. Quem viveu, viveu.


Moa, com o violão, interpretando velhas canções: parece uma pintura impressionista

O bar, que já abrigou uma mercearia, mantém os detalhes arquitetônicos dos anos 50, com luminárias antigas, espelhos com formas arredondadas, cabides para pendurar o chapéu e o muro de cobogós, que divide o ambiente interno. A briga que resultou na tragédia, segundo a notícia publicada nos jornais, teria começado há tempos por causa da instalaçáo de um ventilador...

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A amendoeira que dá nome ao bar e sua fachada, com a turma do Rio Botequim na calçada

Ontem foi um dia triste. Me lembrou a morte do saudoso Armando, do Bracarense.


César, de costas, recebendo a galera na mesa na calçada

Leiam mais sobre o bar e o crime nos blogs Pé-Sujo, do Juarez Becoza, clicando aqui (ou no link, lá embaixo), e no Blog do Moa, clicando aqui.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Boteco, ruídos e choque de ordem


Bar do Belmiro enfrenta a ira dos moradores de um condomínio em frente

Outro dia me falaram que o condomínio transversal ao Belmiro entrou com uma ação contra o boteco por causa do barulho provocado pelas rodas de samba periódicas da casa. Ontem, eu fui à roda de samba do Sabor da Morena. Muito bom e devo dizer que a casa pegou. Estava lotada com pessoas de todas a idades e aquele clima gostoso de boemia. Aquela esquina entre as ruas Fernando Guimarães e São Manuel, diante da praça Mauro Duarte, é um recanto em Botafogo, com seus sobrados e prédios pequenos. Ar de surbúbio, atmosfera de interior, com a molecada jogando bola, soltando pipa, andando de bicicleta, mães com bebês na pracinha e coisa e tal.


Sabor da Morena foi multado por excesso de mesinhas na calçada

Mas já a especulação imobiliária começa a desfigurar o lugar. E o povo de um novo edifício, erguido em tempo recorde e que derrubou três sobrados centenários, já anda reclamando do barulho. Os novos moradores não freqüentam a rua; têm tudo em seu condomínio. De modo que entram e saem de carro, passando por grades com câmeras e preferem fazer suas compras em shoppings, em vez de prestigiar o comércio de rua do bairro. Enfim, são os novos tempos e logo, logo esse trecho de Botafogo sucumbirá à "civilização" e a rua morrerá.


O Alfredinho, do Bip Bip, proibiu bateção de palmas e controla o ruído

Enquanto isso, o choque entre dois tipos de moradores vai se dando em conflitos dessa natureza, como o uso da calçada e o lazer coletivo. O boteco Salvação chegou a um acordo com a vizinhança. Pára o samba às 21h em ponto. Essa é a melhor saída, na minha opinião. Todo mundo satisfeito, e o casal que reclamou na prefeitura já até freqüenta o samba. O Bip Bip tem uma história longa com a vizinhança. Ações na Justiça e o escambau. E o samba do Alfredinho é silencioso perto das rodas que tenho visto por aí.


O samba do Salvação, aos domingos, acaba às 21h em ponto: acordo com os vizinhos resolveu o impasse

Tudo isso me lembrou a pesquisa de um colega antropólogo sobre o ruído na cidade. Ele fez um levantamento em cima das queixas do disque-barulho e descobriu que 90% das reclamações não se referiam ao nível de ruído em si, mas ao tipo de barulho, que vinha sempre adejtivado: "macumba infernal", "pagode de cachaceiro", "funk de bandido", "culto evangélico de pentecostal" e coisa e tal. Ou seja, não era necessariamente o barulho, em termos de volume de decibéis, mas o evento propriamente dito que despertava a contrariedade e a indignação do reclamante.

São sacações como essa que os fiscais responsáveis pelo choque de ordem do prefeito Paes não levam em conta. Têm um modelo de cidade na cabeça, aquela da classe média da zona Sul, e vão impondo a ferro e fogo, sem ouvir o bairro, os moradores, a vizinhança. Sem entender a importância da convivialidade na rua, na calçada. Sem perceber que alguns bairros formam uma comunidade e outros, são lugares sem vida nas esquinas: prédios e prédios que parecem fortalezas e a calçada vazia. Não entendem que cada bairro tem uma personalidade e um jeito de ser.

É verdade que há exageros. Ontem mesmo, depois que o samba acabou no Sabor da Morena, um grupo de fregueses se sentou à calçada, perto de 1h da manhã, e começou a cantar a plenos pulmões, cada um num tom, cada instrumento de percussão batucado de qualquer jeito. Aí nem mesmo os vizinhos que gostam da roda e defendem o bar vão apoiar. O exagero de um lado e de outro é que não deveria vigorar.

sábado, 18 de abril de 2009

Em busca dos malditos


Manuscrito do Gould: sua obra ficou fragmentada, espalhada e inacabada

Meu amigo Marcelo Moutinho, que pode ser encontrado no link do Pentimento abaixo ou clicando diretamente aqui, escreveu um post sobre o grande personagem nova-iorquino Joe Gould, um escritor, vagabundo, dos anos 40-50, que trocava seus textos por bebida e algum canto para dormir. Vivia nas ruas de Manhattan desde que baixara a inspiração para escrever sua obra-prima: The Oral History of Our Time (A história oral de nosso tempo), um romance sobre os personagens das ruas, moradores sem-tero do Metrô, alcoólatras e malucos como ele, pessoas que contavam suas histórias ou pensamentos ou sentimentos, em conversas longas ou curtas, inteligentes ou tolas, saborosas ou irritadas. Isso bem antes que o conceito sociológico de história oral fosse criado.


Retrato de Joe Gould, feito pela Agência Magnum

Já escrevi sobre isso no Pindorama, mas o assunto é recorrente e fascinante. Acho que essas figuras são essenciais à vida urbana, embora estejam se tornando cada vez mais escassas. Penso, trazendo a coisa para cá, no Profeta Gentileza, por exemplo. Essa coisa intermediária entre a marginalidade e a genialidade de quem não pode mais viver sob as regras convencionais. Pessoas que vêem o mundo de um jeito único e, quando cruzam nosso caminho, primeiro assustam e, depois, nos encantam e seduzem, porque se tornam a encarnação da certeza de que a possibilidade humana de ser e estar no mundo é infinita. Diante de suas dificuldades com o mundo convencional, elas se reinventam, muitas vezes de forma sofrida, dramática ou trágica.


Manduka na capa de seu primeiro disco, de 1972

Essa coisa foi tão marcante para as gerações dos anos 60-70, que até se inventou o adjetivo maluco-beleza. Quem é da minha geração deve se lembrar do Jimi Hendrix, um mendigo que dormia nas areias do Pier de Ipanema e sua presença era denunciada pelo forte cheiro de éter. Andava com um violão compondo canções cósmicas. Desapareceu repentinamente, numa época que se removiam favelas a ferro e fogo e sumiam com os moradores de rua da zona Sul. Mas isso é outro assunto.


Erickson Luna recitando em Recife

Penso também nos artistas malditos, sobretudo escritores, poetas e músicos, que são também personagens limítrofes entre a normalidade e a loucura. Normalmente elaboram uma arte requintada, arguta, expressiva e absolutamente marginal, que passa desapercebida pelo mainsstream, pela indústria do setor, pela mídia e todos os mecanismos que hoje domesticam o artista convencional. Eles não se curvam ao sistema, por assim dizer, mais por uma insubordinação atávica do que por uma postura ideológica.


A capa do livro de Luna

Joe Gould era desse quilate porque escrevia para beber. Porém, mais do que um escritor, era um ilusionista, pois sua obra-prima, A história oral de nosso tempo, nunca existiu na inteireza. Apenas em fragmentos que ele fornecia, quando as dúvidas sobre um texto tão exuberante começavam a crescer entre aqueles que o conheciam. E eram trechos geniais. Após sua morte, em 1957, se não me engano, a obra completa nunca foi encontrada. O jornalista que fez seu perfil para a revista New Yorker, Joseph Mitchell, foi em vários endereços onde Gould dissera que havia deixado, fregmentados, os manuscritos da História oral. Necas. Ela nunca havia sido concluída. Apenas trechos que apareciam aqui e ali, e que Gould relutava em mostrar e só em troca de uma boa dose de bourbon (seria ele adpeto do Jack ou do Jim?), liberava a leitura para uns poucos e ávidos privilegiados.


Manduka no México

Na parede do boteco nova-iorquino Minnetta Tarven, freqüentada pelo velho escritor-ilusionista, pode-se ler: "Escrevo para o meu próprio deleite, já que sucede de eu ser o único Joe Gould deste sistema solar. Com isso, não quero excluir a possibilidade de que existam outros sistemas solares cheios de Joe Goulds." De fato, os universos paralelos estão cheios de figuras geniais e até mesmo mais interessantes que Gould, no sentido de terem produzido de fato obras essenciais. Penso, por exemplo, no Erickson Luna, o poeta pernambucano que vivia nas ruas do Recife, cuja voz rascante troava nos mercados e praças em meio a versos de extrema qualidade e beleza. Luna publicou seus poemas num livro solo e em algumas coletâneas apareceram poemas dispersos. Esse era radical e maldito a vera. Morreu na glória da sarjeta, poeta das ruas. E quem o viu recitar, absolutamente mendigo, absolutamente poeta, não o esquecerá.

Luna formava com Francisco Espinhara, outro grande poeta do Recife contemporâneo, falecido pouco meses depois de seu companheiro de letras e bar, o movimento da Poesia Pessimista. Não sei quem cunhou o nome, penso que talvez ele limite um pouco a força lírica dos versos desses homens geniais. Meu amigo jornalista do Recife Braulio Brilhante, amigo de ambos, tem a tarefa hercúlea de escrever a história desses poetas.

Foram forjados na mesma estirpe: Manduka, Sergio Sampaio e Glauber Rocha, entre outros. Coincidentemente ou não, todos mortos. Talvez os tempos atuais não permitam mais o surgimento ou a permanência de figuras como essas, cujos ecos aparecem incompletos em histórias de raro esplendor. Pessoas que, depois de mortas, são transformadas em fetiche (bem, um pouco como faço agora, mas pelo menos tenho a desculpa de ter conhecido a maioria deles).

Acho que, mais do que nunca, são figuras boas para a gente garimpar por aí, em busca de seus resquícios, os fiapos de suas idéias, suas obras incompletas. Tentar entender suas mensagens. Vejo uma garotada, na faixa dos 20 e poucos, escrevendo febrilmente, compondo música, fazendo filmes e buscando inspiração fora das convenções. Mas o mundo se tornou muito audiovisual e virtual, de modo que a carne e o sangue das experiências me parecem um tanto diluídas. Por isso acho os botequins, os mercados, as ruas e os becos lugares viscerais.

Não se trata de salvar a memória de uma forma de fazer arte ou simplesmente de estar no mundo, embora isso seja importante tamném. Trata-se mais de um lembrete de que o mundo não se limita aos limites que conhecemos.

Obs.: As fotos desse post foram surripiadas da internet e algumas são reproduções. Infelizmente não sei o nome dos autores originais.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Amigos e botecos em imagens (3)


A cozinha do Penafiel do Saara. Fechou ano passado, pouco antes de completar 90 anos

Num post recente, tratei de bares centenários da cidade, aproveitando a publicação de uma reportagem que fiz com o fotógrafo Custódio Coimbra para a Revista O Globo, que sai nas edições dominicais do jornal. Tratamos nessa matéria de casas tradicionais como o Decolores, o Paladino, o Armazém Senado, o Restaurante 28 e o Bar do Jóia. A primeira, na Ponta D'Areia, em Niterói, e as demais, no velho Centro do Rio. Todas centenárias. A matéria, que pode ser lida na reprodução alguns posts abaixo, tem um tom de arqueologia de um tipo de comércio de rua, com sua gastronomia e cultura típicas, que vai desaparecendo à medida que não encontra nos herdeiros a disposição de continuar a dura tarefa de tocar o negócio. No texto, menciono rapidamente o Penafiel do Saara, que fechou há quase um ano, pouco antes de completar 90 anos. Pois bem, remexendo meus arquivos para essa série de posts fotográficos, achei algumas fotos do velho Penafiel, que fiz pouco antes do fim Uma casa de pasto, onde se escolhia a comida depois de olhar as panelas com o cardápio do dia. Assim, para matar (ou piorar) a saudade, abro essa seção de fotos com algumas do velho Pena.


O salão do Penafiel, com os velhos ventialdores e o aconchego dos velhos tempos. Fiz essas fotos um pouco antes de atacar uma carne assada com batatas coradas e molho ferrugem. Inesquecível


Na Lapa, o Nova Capela é também um representante da velha tradição. Famoso por seu cabrito com arroz com brócolis e alho, o bar é ponto obrigatório da saideira daqueles que freqüentam os shows do bairro boêmio


Cícero, o garçom boa praça do Capela, que acaba de ganhar a enquete promovida pelo Correio da Lapa, que perguntava quem era o melhor: ele ou Paiva (ex-Jobi)


Amigos jornalistas no Capela, depois do fechamento das edições o bar é uma excelente opção, pois a cozinha atravessa a madrugada funcionando a todo vapor


Amigos no Aurora, chope decente e barato em Botafogo. A cozinha não é mais a mesma dos velhos tempos que as lulas com arroz e brócolis eram referência na zona Sul. Mas ainda assim é um bar onde me sinto bem

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Amigos e botecos em imagens (2)


O Amendoeira ao cair da tarde, numa tarde em que vários amigos se reuniram à sua entrada

Nada mais carioca do que encontrar os amigos no bar. De preferência o da esquina, que é sempre o melhor. O melhor por ser mais próximo, o melhor por ser, na maioria dass vezes, o mais simples. Todo dono de boteco que conheço tem lá sua mania de grandeza. Alguns sonham em reformar o banheiro, outros querem trocar as mesinhas. O senso estético quase sempre insólito. Mas, na maior parte das vezes, o tema é apenas assunto de balcão. Nasce e morre ali.


O chope e a carne seca desfiada são as estrelas do Amendoeira, em Maria da Graça

Os novos bares que estão surgindo, no entanto, têm mostrado em geral um ar tão suntuoso que dificilmente dá pra classificá-los na categoria botequim. Vejam bem, nada contra. São bares onde acontecem shows programados, eventos sociais, como lançamento de disco, e coisa e tal. São espaçosos, iluminados (às vezes excessivamente, como o Chico & Alaíde), decorados e impecáveis no serviço. Ótimo. Vamos ver o novo show do Moa, vamos conhecer o novo livro do Marcelo Moutinho. Mas no dia seguinte, de bermuda e sandália, não deixemos de ir à esquina, encontrar os amigos da vizinhança, pedir uma gelada e comentar o futebol e a política e admirar as belas que passam, alheias, em frente ao bar. Se der fome, atacar o prato da casa.


Baiano diante de uma rabada e ampolas geladas no Bar do Paulinho, em Higienópolis

É a idéia de estar à toa que me comove e atrai para essas casas. A idéia materializada do ócio criativo (quantas idéias sensacionais, quantos projetos não surgem nesses lugares?) e, o que é melhor, compartilhado com amigos e mesmo desconhecidos. Bem, como disse no post anterior, as fotos expostas aqui são, na maioria das vezes, de momentos em que esse sentimento estava presente, assim como os amigos.


A bela Isabel de Luca na Adega Tudo do Mar, na Ilha. O bar pode não ser grande coisa, mas a Isabel...


Balcão do Real Chope, em Copacabana. Botequim de esquina e excelente chope


Codorna do Feio, no Méier. O nome diz tudo, tanto em relação à qualidade da codorna na brasa, quanto à beleza natural do dono, o cearense Sebastião de Souza


O Bar da dona Maria, na Muda, me lembra carnaval, samba e Moacyr Luz


Juninho, da Adega da Velha, em Botafogo. Reparem nas cachaças à direita


Denise Lopes sapecando azeite em seu risoto transmontano, no Bar do Serafim, em Larangeiras

sábado, 4 de abril de 2009

Amigos e botecos em imagens (1)

Amigos, remexendo nos arquivos fotográficos de anos de perambulações por botequins desta cidade maravilhosa, deparei-me com imagens de tempos distintos, momentos entre as mesas dessas casas onde passei boa parte do meu tempo. Também imagens de amigos. Então decidi fazer uma seleção, meio sem sentido, apenas obedecendo o gosto deste pobre e desvalido blogueiro. Ei-las (depois virão mais):


Mila Chaseliov, a Miloca, grande amiga, na Adega Pérola, há uns três ou quatro anos, se a memória me ainda me serve


A Adega da Velha, do meu querido amigo Chico Rufino e seu filho Júnior. Palco da minha dissertação de mestrado: "Pendura essa: A complexa etiqueta nas relações de reciprocidade em um botequim do Rio de Janeiro", defendida na UFF, em 2003


Soraya Simões (à esquerda) e Jussara Freire, em pleno carnaval de 2007, onde devoramos uma feijoada branca na Adega Flor de Coimbra, com a fome de quem saiu antes no bloco do Bola Preta


Visão aérea do Aurora, um boteco centenário em Botafogo


Bar Lagoa fechando, o bar art déco da Lagoa, ex-café Berlin


A cozinha do Cervantes após a reforma de 2008. Um pouco mais de espaço pra rapaziada que prepara os recheios dos sanduíches da casa


A turma da antropologia na calçada do Decolores, na Ponta D'Areia, em Niterói: (Felipe Berocan, à esquerda, Marco Antonio da Silva Mello, com o violão, Dri Duval, Soraya, à cabeceira, Letícia e Fabinho