terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

A cidade dos arquitetos

A pracinha Mauro Duarte e a rua Fernandes Guimarães ao fundo. Mais um condomínio será erquido no local

O assunto está no ar. O Segundo Caderno do Globo publicou uma reportagem interessante da Catharina Wrede no último sábado sobre a arquitetura da cidade. É verdade que teria sido mais abrangente e interessante se a reportagem não tivesse se restringido à visão dos arquitetos, englobando a voz de urbanistas, sociólogos, historiadores, antropólogos, geógrafos e outros pensadores da cidade, assim como, talvez, moradores que vivem nos bairros em constante transformação. Tenho sempre a impressão de que os arquitetos querem o monopólio da discussão sobre a cidade, como se tudo fosse uma questão de linhas arquitetônicas e de fachadas com estilo. E, assim, caímos no velho debate entre a visão racionalista dos modernistas, como Le Corbusier, Niemeyer e Lúcio Costa, ante uma visão mais, digamos, orgânica da cidade.

Mas o fato é que a grande arquitetura que domina hoje na cidade é a arquitetura comercial, dos condomínios fechados, da lógica defensiva, impregnada de uma ideologia elitista e segregacionista dos espaços urbanos. A estética cafona desses empreendimentos é menos importante do que a promessa de exclusividade e auto-suficiência que eles oferecem. A reportagem, que ouviu vários arquitetos, aponta mesmo para o fato de que os estilos arquitetônicos reconhecíveis do Rio de Janeiro pararam na década de 60. Trata-se do que sobrou do período colonial ou das reformas de Pereira Passos, da art déco dos anos 30-40, até os exemplos modernistas da década de 60. A partir daí é um mundo diluído, sem um "rosto" reconhecível, comercial.

Todas essas observações são reconhecidas pelos arquitetos entrevistados pela Catharina. Alguns apontam que o Rio perdeu o papel protagonista na construção de uma identidade arquitetônica brasileira e que os profissionais do setor não se preocupam com o que vai sendo erguido na cidade, de prédios a viadutos, que sobem sem critérios ou discussão. Ou seja, se não há uma discussão arquitetônica, de estilo, muito menos há uma sobre os impactos e os efeitos dessas intervenções na morfologia social dos bairros. Não se trata só de debater linhas estéticas do casario, das avenidas, viadutos, praças etc. mas refletir também sobre como essas construções interferem na vida cotidiana do bairro, das pessoas que moram nele. Por isso, esse debate é sério demais para se restringir a arquitetos.

Enquanto isso, já está anunciada a construção de mais um espigão na saturada rua Fernandes Guimarães, em Botafogo, Solar não sei das quantas. O cartaz indica o sucesso de vendas e que é bom quem estiver interessado correr, pois estão negociando os últimos apartamentos. Mas, nas conversas da esquina, só ouço lamentações. Mais um prédio para fazer sombra nas vilas e casas que restam, mais carros na saturada rua, mais um condomínio exclusivo, fechado e de costas para o bairro, ajudando a esvaziar as calçadas, as praças e a vida da esquina.

Nenhum comentário: