terça-feira, 15 de junho de 2010

Bangüê e a arte de Zé Lins no tempo


Comecei a reler Bangüê, do Zé Lins do Rego, e fiquei surpreso com minha admiração que, entre essa e a primeira leitura há muitos e muitos anos, só fez crescer, sem que me desse conta. Me encanta o domínio da narrativa, ao mesmo tempo enxuta, como é o gosto da prosa de hoje, mas com elementos líricos, aqui e ali, que trazem aquela "imageria" a quem lê com sensibilidade. Isso me fez pensar, mais uma vez, na transição, ocorrida na segunda metade do século passado, de uma cultura em que a cognição era basicamente literária, sendo o rádio o meio de comunicação de massa mais utilizado e a TV ainda uma novidade, para a percepção extremamente audiovisual dos dias de hoje.

Com a nova cultura, uma nova moral, evidemente. E a tendência é achar que à medida que a humanidade ocidental "evolui", se torna mais liberal e livre de preconceitos. Mas, imagine o que aconteceria hoje, só para ficar no exemplo da pedofilia, com a mania de Lewis Caroll de escrever cartas a suas amiguinhas. Ou se Nabokov escrevesse hoje sua Lolita. Outro dia ajeitava os livros de casa e encontrei um do fotógrafo Jock Sturges, autor da foto que ilustra esse post, especializado em nus de famílias em campos de nudismo, cujos portraits trazem muitas crianças nuas, algumas mal entradas na puberdade. Acredito que hoje esse livro seria proibido, como um juiz proibiu a publicação de um trabalho de um fotógrafo paulista, cujo nome não me lembro, porque trazia crianças nuas.

Enfim, como sempre, trata-se do óbvio. Os tempos mudam e com eles as noções de certo e errado, de puro e impuro, sujo e limpo e por aí vai (hoje, por exemplo, muitas mulheres consideram os pelos pubianos um desleixo anti-higiênico imperdoável e andam todas raspadinhas por aí... hum!). A reação de quem vem de outro tempo, às vezes, é agarrar-se a valores que já foram embora, como melhores do que os atuais. Outros têm uma capacidade invejável de se atualizar constantemente, sendo pessoas de espírito desenraizado. De qualquer modo, fico feliz de deixar Zé Lins me levar mais uma vez por seu engenho e, com ele, me emocionar diante encontro com o amor e o baque bruto da desiluão no coração.

4 comentários:

ips disse...

quero ler Banguê.

ipaco disse...

É sensacional! A segunda parte, então, quando nosso herói conhece Maria Alice... bjs.

Anônimo disse...

adorei a mudança visual. morri de saudade de vc, hj, no aconchego carioca. saudades, beijo

ipaco disse...

Putz! faz tempo que não vou ao Aconchego... aliás, a lugar nenhum... estou superdevagar, sem granda, velho... mas me aguarde. O segundo tempo vai começar em breve...

saudade
pt